Enquanto o Brasil ouve diariamente a demagogia de discursos sobre “responsabilidade fiscal”, contenção de despesas e reformas que sempre caem no colo de quem mais precisa, a Câmara dos Deputados deu ontem mais um passo para ampliar o próprio tamanho — e a própria conta.
O projeto que aumenta de 513 para 531 o número de deputados federais terá impacto direto de R$ 64,6 milhões por ano no orçamento público. O argumento usado é o crescimento populacional revelado pelo Censo.
Mas o que deveria ser uma redistribuição justa de cadeiras ou de custos virou, na prática, um aumento real de cargos — sem que nenhum estado perdesse representação e, no caso de alguns, ampliasse a sua quantidade de deputados.
A matéria era prioridade do presidente da Câmara, paraibano Hugo Motta (Republicanos). A relatoria também ficou nas mãos de um paraibano, Damião Feliciano (União Brasil). E a autora do texto é Dani Cunha (PL-RJ), filha do ex-presidente da Casa Eduardo Cunha. Ou seja, é uma articulação suprapartidária: direita, centro, esquerda — quando é para ampliar privilégios, não há ideologia que separe.
O contraste é gritante: enquanto se discute o congelamento do salário mínimo, se defendem reformas que endurecem as regras para o trabalhador e o aposentado, o Congresso articula a ampliação de cargos e estrutura própria.
E depois, claro, virão os mesmos discursos: é preciso cortar gastos, conter a máquina, rever auxílios. Mas só os dos outros.
Ou melhor, dos pobres.