Não foi culpa da leoa do zoológico de João Pessoa.
E muito menos do “Vaqueirinho de Mangabeira”, o menino que sonhava em ter uma mãe e em ser notado por alguém.
Desde os 10 anos, ele estava sob tutela do Conselho Tutelar. A mãe, diagnosticada com esquizofrenia. O pai, ausente. Eram cinco irmãos — quatro foram adotados. Só ele ficou. O que mais desejava era ter uma família. Nunca foi escolhido.
Gostava de animais silvestres. Tinha sonhos como qualquer criança. Em sua inocência dolorosa, dizia querer ser preso para ter um lugar onde ficar. Nenhum pedido foi ouvido. Nenhum direito foi garantido.
Hoje, o desfecho trágico apenas confirmou o que já estava escrito nas entrelinhas da sua vida: o abandono.
Sozinho, entrou no zoológico de João Pessoa, em pleno domingo, diante de famílias e crianças. Atravessou as árvores, invadiu a jaula dos leões e foi atacado. Morrendo ali, diante de um país que se acostumou a ver a miséria de longe — e a culpá-la pelo próprio destino.
Não foi culpa da leoa.
Foi culpa de um sistema que falha todos os dias. De políticas públicas que não protegem. De instituições que se esvaziam de humanidade.
Foi culpa de uma sociedade que romantiza a caridade e esquece a responsabilidade.
O “Vaqueirinho” não queria comida, nem piedade. Queria pertencer.
Que sua morte nos lembre, com urgência, que proteger os vulneráveis é dever — não favor.
E que nenhuma criança deveria morrer por falta de quem a enxergasse.