(Valor Econômico) A fala do presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva foi amplamente aplaudida por seus colegas, na reação mais entusiasmada até o momento entre as falas dos chefes de governo, Estado e representantes de organizações internacionais ao início da Cúpula para um Novo Pacto Financeiro Global, em Paris, nesta sexta-feira.
Lula voltou a defender a desdolarização da economia, afirmando que não sabe porque “Brasil e Argentina, Brasil e China têm que fazer comércio em dólar”.
Segundo o presidente brasileiro, o assunto será debatido durante as próximas reuniões do G20 e dos Brics, no segundo semestre deste ano. De acordo com Lula, é importante que mais países africanos estejam em tais fóruns.
Logo após o discurso de Lula, o presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa, disse que o petista “não precisa se preocupar” porque a desdolarização será prioritária na cúpula dos Brics, que será sediada em seu país.
Lula foi aplaudido por seus colegas ao dizer que “vai entregar” suas promessas de combater o desmatamento, preservar o meio ambiente e tirar novamente o Brasil do mapa da fome.
“Se pudesse, pegava o chanceler alemão para ser ministro de Minas e Energia do meu país”, disse. “Estou doido para fazer um acordo com a UE, mas carta adicional faz ameaça.”
O presidente chamou ainda seu antecessor, Jair Bolsonaro, de “fascista” devido aos retrocessos democráticos. “Quando voltei à Presidência agora, meu país estava pior do ponto de vista democrático porque tinha um fascista governando. Pior do ponto de vista educacional porque não havia dinheiro investido nas universidades. Pior do ponto de vista social, do ponto de vista econômico.”
Segundo Lula, agora será necessário “refazer tudo para o país voltar a crescer”, mas que “a questão climática não é uma coisa secundária”.
“Por isso, o Brasil vai levar a cabo o controle do desmatamento. Por isso vamos pôr como uma questão de honra acabar com o desmatamento na Amazônia até 2030”, disse, afirmando que não é preciso destruir mais sequer um quilômetro.
De acordo com Lula, se não houver uma mudança no sistema de governança global, os acordos internacionais não serão cumpridos. Pactos como o Protocolo de Quioto, disse ele, não foram cumpridos porque não há autoridade com força para fazer isso acontecer.
“É preciso ter clareza que, se não mudarmos as instituições, o mundo vai continuar o mesmo. Quem é rico vai continuar rico, quem é pobre vai continuar pobre”, afirmou. “Muitas vezes, a classe política do mundo só valoriza o pobre em época de eleição.”
O petista, em seguida, disse que os pobres são a solução, não o problema — e que é necessário colocá-los no Orçamento nacional porque, caso contrário, “sempre estarão abandonados”. Após as eleições, afirmou, são esquecidos, “e a vida segue”.
Ele criticou a falta de ênfase no combate à desigualdade no fórum internacional, afirmando “não ser possível que em uma reunião entre países importantes a palavra desigualdade não apareça”.
“Junto da questão climática, temos que pautar a palavra desigualdade”, disse. “A desigualdade salarial, a desigualdade racial, a desigualdade de gênero, na educação, na saúde. Estamos em um mundo cada vez mais desigual.”
Se o tema não for prioritário, disse Lula, pode haver “um clima muito bom, mas o povo pode continuar a morrer de fome”. O petista depois falou do sucesso no combate à fome durante seu primeiro mandato, dos retrocessos dos últimos anos, e da piora recente na economia brasileira.
Lula voltou a repetir suas críticas contundentes ao sistema de governança global e aos bancos internacionais. Diante da diretora-geral do FMI, Kristalina Georgieva, o petista afirmou que “muitas vezes os bancos emprestam dinheiro e depois o que vemos é a falência do Estado, como na Argentina”.
O presidente brasileiro disse que o FMI, “da forma mais irresponsável do mundo”, emprestou US$ 44 bi à Argentina e afirmou que “não se sabe” o que o governo Macri à época fez com o dinheiro. As consequências, disse Lula, hoje são enfrentadas pelo aliado Fernández.
“Temos que rever aquilo que foi criado depois da Segunda Guerra Mundial. As instituições de Bretton-Woods não funcionam mais”, disse Lula, afirmando que as instituições deixam muito a desejar.
Lula reforçou o convite para que os colegas e a comunidade internacional visitem o Brasil durante a COP30, em 2025, em Belém. O petista lembrou também que haverá em 12 de agosto uma cúpula dos países amazônicos na capital paraense, onde o objetivo será fazer com que os países detentores da Amazônia cheguem com propostas conjuntas na COP22.
“Espero que todas as pessoas que prezam tanto pela Amazônia participem da COP25, para que tenham noção do que é realmente a Amazônia”, afirmou.
O presidente chamou de “pessoas de má fé” empresários e outros empreendedores que destroem ou defendem a destruição da floresta para fins econômicos, destacando que isso também é ruim para os negócios. Lula, em seguida, reforçou o compromisso de combater o desmatamento ilegal em todos os biomas.
Lula começou sua fala cumprimentando o presidente francês, Emmanuel Macron, anfitrião do encontro, e citando nominalmente a ex-presidente Dilma Rousseff, que agora chefia o Banco de Desenvolvimento dos Brics. O presidente brasileiro disse que passou a semana escrevendo seu discurso, mas decidiu não ler o texto previamente escrito porque mudou de ideia após as últimas conversas.