(Kubistchek Pinheiro — MaisPB) Há três anos, o jovem médico paraibano Gustavo Vieira Dias, (profissional da Família e Comunidade), vem atuando como coordenador do Projeto ProCannabis em nosso estado. O uso terapêutico da Cannabis é destinado para pessoas cujas patologias e condições de saúde indicadas, sofrem de epilepsia, espasticidade, dor crônica, autismo, efeitos adversos de quimioterapia do câncer ou HIV, além dos cuidados paliativos, certos transtornos mentais, neuropatias e doenças autoimune. Há seis anos, Gustavo Vieira Dias já trabalha com com Cannabis.
Gustavo Dias é professor de medicina e coordenador do projeto ProCannabis (Ambulatório de usos terapêuticos da Cannabis Sativa) e do estágio “Cannabis e Integralidade” da residência em MFC do UNIPÊ
É membro da Sociedade Panamericana de Medicina Canabinóide, terapeuta com anos de experiência clínica, um estudioso do tema, que vive proferindo palestras em vários estados e para fora do país, aprofundado a pesquisa sobre usos terapêuticos da maconha.
É também pós-graduado em Psicanálise e Medicina Tradicional Chinesa/Acupuntura
O estado da Paraíba é pioneiro nesse segmento, que tem repercussão nacional. João Pessoa vai ganhar um museu, que se chamará “Casa José Maranhão” (instalado onde durante anos morou o senador José Maranhão, tendo sido também seu escritório), numa iniciativa da ABRACE Esperança. “Teremos um acervo de objetos e quadros que contam a história da maconha”, revela Gustavo.
Leia a entrevista exclusiva do médico Gustavo Vieira Dias ao MaisPB e saiba mais sobre os avanços do ProCannabis e os benefícios do tratamento terapêutico.
MaisPB – Vamos começar pelo básico: o que é cannabis medicinal?
Gustavo Dias – Cannabis Medicinal é um termo que se refere a formas de uso de produtos derivados da maconha com fins terapêuticos. Vale destacar que o termo é redundante e sem precedentes, pois não há outras plantas de uso medicinal ou mesmo fármacos sintéticos para os quais foram criados termos semelhantes. Por exemplo: não se fala em “boldo medicinal” ou “ópio medicinal” (lembrando que medicamentos como codeína e morfina são derivados do ópio). Pois está implícito que dependendo da pessoa que usa, da forma de uso e da dose usada, a substância tem o potencial de trazer benefícios, ou seja, de ser medicinal, assim como tem o potencial de causar danos. Isso é o que acontece com os medicamentos de forma geral. Isso dá a impressão de que alguns setores têm o interesse de provocar uma distinção entre medicamentos feitos a partir da maconha (vendidos nas prateleiras) da própria planta, que há milhares de anos é cultivada e consumida pela humanidade. Como se, de um lado, tivesse o remédio que é bom e do outro, a planta que é necessariamente ruim, perigosa.
MaisPB – Quando você começou a trabalhar com o uso dessa planta para fins terapêuticos?
Gustavo Dias – Eu comecei em 2017, após participar de uma sessão na Assembleia Legislativa da Paraíba que debateu o tema com a população. Foi quando identifiquei a carência de médicos sensíveis à causa para acompanhar as famílias que necessitam dos medicamentos à base de maconha. Esse ano também foi quando a ABRACE conseguiu a autorização da justiça para cultivo e produção de medicamentos. E quando ocorreu a inclusão da Cannabis Sativa na Lista Completa das Denominações Comuns Brasileiras (DCB) sob a categoria de “planta medicinal”. Além disso, o primeiro medicamento foi aprovado pela ANVISA para venda nas farmácias, contendo THC e CBD.
MaisPB – Como um paciente deverá fazer para ser tratado com o canabiol?
Gustavo Dias – O paciente, para ter acesso ao tratamento, deve passar por avaliação médica para, posteriormente, com a indicação identificada e documentação médica em mãos, buscar as associações, farmácias ou empresas estrangeiras para importação.
MaisPB – Quando começou esse trabalho em nosso estado?
Gustavo Dias – O trabalho começa no estado da Paraíba antes disso, por volta de 2014, sendo um estado pioneiro na luta no nosso país, quando famílias que necessitavam dos medicamentos começaram a se organizar no primeiro movimento associativo do Brasil, o que se desdobrou no surgimento de duas associações da Paraíba, que até hoje tem grande destaque a nível nacional, a Liga Canábica e a ABRACE Esperança, que desde então vem desenvolvendo um trabalho importantíssimo de acolhimento a outras famílias e luta para garantir acesso aos medicamentos, que se mostraram essenciais para a qualidade de vida dessas famílias.
MaisPB – Explica pra gente o que é o CBD?
Gustavo Dias – O CBD ou canabidiol é um dos mais de 500 compostos químicos presentes na maconha. O CBD, além do THC e mais de 150 outros componentes, são denominados canabinóides. E muitos deles apresentam em pesquisas pré-clínicas ou clínicas potenciais terapêuticas para diversas condições de saúde.
MaisPB – Você acredita que ainda há preconceito por parte da população em relação a esse tratamento?
Gustavo Dias – Infelizmente ainda é perceptível o preconceito por grande parte da população, porém, também percebo uma rápida evolução na aceitação social, muito atrelada ao avanço das pesquisas e a um papel importante da mídia de divulgar os benefícios desse tratamento. Além do importantíssimo trabalho de base, que tem contribuído para a desconstrução do preconceito, realizado pelas famílias de pacientes e apoiadores, como advogados, professores, pesquisadores, profissionais da saúde, antropólogos e cultivadores…
MaisPB – Como médico e trabalhando nessa área, que tipos de patologias estão sendo tratadas com sucesso com o óleo da Cannabis?
Gustavo Dias – Sim, trabalho. Temos conseguido trazer benefícios e qualidade de vida para pessoas com variadas condições de saúde, como epilepsia, espasticidade, dor crônica, autismo, efeitos adversos de quimioterapia do câncer ou HIV, cuidados paliativos, certos transtornos mentais, etc.
MaisPB – A Paraíba está na frente no Nordeste neste trabalho?
Gustavo Dias – A Paraíba está à frente no Brasil como um todo. A Paraíba foi o primeiro estado a ter uma associação com autorização da justiça para cultivo, que durante muito tempo foi a única. A UFPB teve um dos primeiros projetos de extensão sobre Cannabis, e a primeira disciplina sobre o tema em universidade pública do Brasil. A Paraíba foi um dos primeiros estados a aprovar um dia estadual de visibilidade de Cannabis terapêutica. O estado também aprovou uma lei de incentivo à pesquisa na área.
MaisPB – Você falou que em Campina Grande um cidadão ganhou na justiça o direito de plantar para o uso medicinal?
Gustavo Dias – Em João Pessoa tivemos a oportunidade de acompanhar e embasar o processo de um paciente com quadro de dor crônica que conseguiu o primeiro Habeas Corpus (HC) da Paraíba para cultivo doméstico da maconha para fins medicinais, inclusive conquistando o direito ao uso inalatório das “flores” in natura, pois essa via de administração tem início de ação mais precoce. Além desse caso, outros pacientes já conquistaram HC na Paraíba e dezenas pelo Brasil afora.
MaisPB – Você tem feito muitas palestras sobre esse tema?
Gustavo Dias – Sim. Tive a oportunidade de apresentar o tema em diversos congressos científicos médicos ou de outras áreas, regionais, nacionais e até internacionais. O que evidencia o avanço do interesse na temática pela ciência.
MaisPB – Esse óleo pode servir para pessoas com depressão?
Gustavo Dias – É possível que sim. Há diversos indícios teóricos e pré-clínicos (que são dados baseados em estudos em laboratório) que indicam um potencial dos canabinóides para tratamento de transtornos mentais, como depressão, porém esse efeito precisa ser corroborado por grandes estudos clínicos (em humanos).
MaisPB – Vamos ganhar um museu em nosso Estado? Onde?
Gustavo Dias -Sim. O museu é uma iniciativa da ABRACE Esperança, que ficará localizado em João Pessoa, onde teremos um acervo de objetos e quadros que contam a história da maconha.