A praça da caveira em Campina Grande (por Olímpio Rocha)

Por Maurílio Júnior

Considerado guru do bolsonarismo, o finado Olavo de Carvalho está prestes a receber uma homenagem aqui em Campina Grande: é que a Câmara Municipal, por maioria, aprovou projeto de lei que determina a nomeação de uma rua e de uma praça da cidade em alusão ao desaparecido filósofo que, entre várias promessas, já afirmou, numa espécie de exteriorização freudiana de desejo, que “chuparia o cu de Caetano Veloso” caso o governo Bolsonaro tivesse algum escândalo de corrupção. Entretanto, mesmo após rachadinhas, esquemas na compra de vacinas e orçamento secreto não se tem notícia de que a promessa olavista tenha sido cumprida. Pelo contrário, ele foi processado e condenado pela afirmação libidinosa contra o cantor baiano.

Responsável pela indicação de ministros do governo Bolsonaro, como Ricardo Vélez – da Educação – e Ernesto Araújo – das Relações Exteriores – ambos demitidos por incompetência (o que surpreende, até para os padrões bolsonaristas), Olavo tinha sido cogitado para ser embaixador nos Estados Unidos – onde está sua cova – e onde morava há vários anos fugindo de processos judiciais por dívidas astronômicas oriundas de calotes e estelionatos que praticou no Brasil, enquanto aqui morou. Conhecido como astrólogo fajuto, era acusado, por sua filha mais velha, Heloísa de Carvalho, de ter sido péssimo pai e de nada ter se dedicado à família, o que, aliás, depõe contra seu falso e moralista discurso conservador.

Olavo de Carvalho foi um contumaz crítico das vacinas e duvidava, explicitamente, que o coronavírus teria o poder letal que provou ter. Afirmou que a pandemia não passava de uma “historinha de terror” para acovardar a população e disse que as medidas de isolamento social eram um “crime sórdido”. Após as mortes de mais de 600 mil brasileiros e brasileiras, entre eles e elas mais de 10 mil paraibanos e paraibanas e mais ou menos mil campinenses, viu-se que Olavo, definitivamente, não tinha razão. Outrossim, dizia ele, tinha suas dúvidas sobre se o Planeta Terra é redondo ou não. Por isso mesmo, entrou no panteão de terraplanistas mais celebrados do globo. Como um marido traído que nega o chifre que leva, foi mais um negacionista que morreu de COVID.

Carvalho também se notabilizou, antes da “indesejada das gentes” vir ceifá-lo, por discussões públicas com nomes de proa da base “intelequituau” de Bolsonaro: brigou com o pastor milionário Silas Malafaia, a quem acusou de enriquecer às custas da fé alheia; chamou de palhaço o empresário Luciano Hang, o famoso “Véio da Havan” (aquele que se veste de terno verde-amarelo, como um decrépito Louro José); disse que o jornalista Felipe Moura Brasil, ídolo nas hostes governistas, seria um reles puxa-saco; e sobrou até para a equivocadíssima ex-secretária de cultura Regina Duarte, tachada de incompetente. Pensando bem, por essas críticas, até que o defunto merecia mesmo uma homenagem como a que receberá em Campina…

O extinto astrólogo fazia grande sucesso na internet, onde veiculava cursos sobre filosofia e defendia a posse livre de armas, nos quais disparava mais palavrões e xingamentos que qualquer outra coisa, o que acabava atraindo a atenção de jovens e adolescentes reclusos em suas casas e computadores, em sua maioria do sexo masculino, sem namoros, que preenchiam seu tempo livre admirando um suposto intelectual crítico do sistema, vociferando contra o mainstream que não lhes permitia perder a virgindade fora do mundo virtual. Adepto do anacrônico globalismo, que ainda divide o mundo geopoliticamente em comunistas e capitalistas, como na Guerra Fria, Carvalho era ídolo dessa turma, alguns deles tendo se tornado deputados e vereadores, vejam só!

Esses jovens fãs do falecido, muitos viciados em joguinhos de tiro online, nos quais dão vazão ao seu ímpeto de machos, mas que, na vida real, engasgam com qualquer crustáceo (se é que me entendem), são adeptos da misoginia, também por influência de Olavo, sempre colocando as mulheres em odiosa posição de submissão aos homens. Curiosamente, têm entre eles, inclusive, um representante campinense no afamado “gabinete do ódio” presidencial, responsável pela produção das fake news que elegeram Bolsonaro, em 2018. Dizem as más línguas de Brasília que esse peixe pequeno que migrou do Açude Velho ao Paranoá, será lançado, em breve, aos tubarões de capa preta, sacrificando-se por amor ao capitão olavista a quem bajula.

Enquanto o povo campinense clama por transporte público de qualidade, pela reabertura das cozinhas comunitárias e pela efetivação de políticas públicas de emprego e renda que amenizem a dificuldade que hoje é viver num país tomado pela pulsão de morte olavista e bolsonarista, a Câmara de Vereadores de Campina Grande, por sua maioria, tomou a iniciativa de cravar nas artérias da cidade uma infeliz celebração póstuma a um dos artífices responsáveis pela ascensão ao poder do miliciano que louva a tortura, saudosista da ditadura militar que matou centenas de compatriotas e que entrará nos livros de história como o pior presidente da história do Brasil, tal qual alguns dos nossos vereadores parecem querer disputar o prêmio de piores da história da Casa de Félix Araújo.

Aprovado o projeto de lei que homenageia o putrefato guru, atual almoço de minhoca e jantar de tapurus, caberá ao Prefeito Bruno Cunha Lima sancioná-lo ou não. Como se sabe, apoiado que é pelos olavistas de carteirinha da Serra da Borborema, que têm até um sepulcro caiado por aqui, com forte influência no Palácio do Bispo, o alcaide certamente assinará a norma e, em breve, abrindo caminho para a mudança da tradição de atirar milho aos pombos para jogar carniça aos urubus em praça pública, tudo indica que teremos em Campina Grande um logradouro homenageando o pensador contemporâneo que abotoou o paletó de madeira sem cumprir a promessa de sorver o orifício rugoso do irmão de Maria Betânia.

Em consonância com os ensinamentos do rijo guru que ora se celebra, cujo negacionismo, como exposto, ajudou a tirar a vida de mil cidadãos e cidadãs campinenses, a futura “Praça Terraplanista Olavo de Carvalho” com certeza será mundialmente conhecida! Campina, afinal, é o “centro de irradiação cósmica do universo”, como dizia Humberto de Campos, e já corre na boca do povo que o equipamento público levará a alcunha global de “Praça da Caveira”. Deverá ter uma pista de cooper em formato de caixão, cruzes de cemitério como halteres para exercícios físicos e tudo indica que poderá ser inaugurada no próximo 2 de novembro, dia de finados. Pena que o homenageado não poderá se fazer presente ao corte de fitas, afinal, Olavo de Carvalho está morto.

(Por Olímpio Rocha – Advogado, Professor, Mestre em C. Jurídicas, Presidente Conselho Estadual dos Direitos Humanos)