Os dois homens mais poderosos do universo econômico brasileiro, Paulo Guedes e Roberto Campos Neto, respectivamente ministro da Economia e presidente do Banco Central, aparecem no Pandora Papers. Ambos, segundo a investigação do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ, em sua sigla em inglês), criaram empresas em paraísos fiscais e nunca informaram sobre isso à opinião pública, apesar da relevância de seus cargos.
Guedes, de 72 anos, aparece como acionista da empresa Dreadnoughts International Group, registrada nas Ilhas Virgens Britânicas. Trata-se de uma shelf company, como são conhecidas no jargão financeiro: empresas fundadas em paraísos fiscais, mas que podem permanecer anos sem atividade à espera de que alguém lhes dê uma função.
Os documentos mostram que o ministro possuía em 2014 pelo menos oito milhões de dólares (43,3 milhões de reais, pelo câmbio atual) investidos na companhia, registrada em seu nome e nos de sua esposa, Maria Cristina Bolívar Drumond Guedes, e filha, Paula Drumond Guedes. Esse número subiu para 9,5 milhões no ano seguinte, segundo os documentos obtidos pela investigação, liderada pela revista Piauí.
Segundo a reportagem do site Metrópoles, a abertura de uma offshore ou de contas no exterior não é ilegal, desde que o saldo mantido lá fora seja declarado à Receita Federal e ao Banco Central. Mas, no caso de servidores públicos, a situação é diferente.
O artigo 5º do Código de Conduta da Alta Administração Federal, instituído em 2000, proíbe funcionários do alto escalão de manter aplicações financeiras, no Brasil ou no exterior, passíveis de ser afetadas por políticas governamentais.
A proibição não se refere a toda e qualquer política oficial, mas àquelas sobre as quais “a autoridade pública tenha informações privilegiadas, em razão do cargo ou função”. Em janeiro de 2019, cinco anos depois de abrir a offshore e depositar US$ 9,54 milhões, Guedes virou o principal fiador do governo Bolsonaro e assumiu o cargo de ministro da Economia, sob cuja responsabilidade está um enorme leque de decisões capazes de afetar seus próprios investimentos no exterior.
Penas para quem infringe o artigo 5º variam de uma simples advertência à recomendação de demissão. Apesar do conflito de interesses em potencial, o ministro quis manter o controle da offshore nas Ilhas Virgens Britânicas. Em janeiro de 2019, assim que assumiu o ministério, ele diz ter informado à Comissão de Ética Pública, encarregada de julgar possíveis infrações ao código, que controlava uma offshore num paraíso fiscal.
Em julgamento ocorrido em julho passado, o órgão, formado por sete conselheiros, não viu nenhuma irregularidade e arquivou o caso. A piauí pediu ao órgão a justificativa da decisão, mas recebeu como resposta que as informações contidas nos julgamentos são sigilosas “em face dos dados sensíveis que delas constam – inclusive fiscais e bancários”.