“Hoje não mais, mas naquele tempo muita gente tinha vergonha de falar que era da Paraíba, do Nordeste. Eu queria homenagear e pensei que era uma boa oportunidade, por ser jogo decisivo. Estava confiante que faria gol e aí todo mundo poderia ver a camisa”. O depoimento é daquele que, se não foi o melhor paraibano na história do futebol, indiscutivelmente foi o mais representativo: Marcelinho Paraíba. Aos 44 anos, chega ao fim neste domingo (15), com a camisa da Perilima em partida contra o CSP pelo Campeonato Paraibano, a trajetória de um dos grandes nomes do futebol brasileiro no fim da década de 90 e início dos anos 2000.
Há 21 anos, já aos 24 anos de idade, o dia 21 de novembro de 1999 ficou marcado para sempre na história do filho de Pedrinho Cangula – autor do primeiro gol do estádio Amigão e um dos artilheiros históricos do Campinense. Somente conhecido como Marcelinho, o jogador que havia sido revelado pela Raposa seis anos antes, entrava no imponente Morumbi para não só decidir uma partida importante do Campeonato Brasileiro, mas mostrar ao Brasil que ali era um Paraíba e tinha muito orgulho de ser.
Contra a Ponte Preta pelas quartas de finais, o São Paulo desceu para o vestiário no intervalo perdendo por 2 a 0. Era a primeira partida do mata-mata decidido em três jogos e um revés daquele seria fatal. Mas entraria em cena Marcelinho. Ou melhor, a Paraíba toda.
Marcelinho entrou no segundo tempo e fez três gols. Em um dos tentos, o jogador levantou a camisa do São Paulo para mostrar uma que homenagearia a sua terra com os dizeres “100% Paraíba”. Um gesto significativo naquela época, pois como bem disse, com razão, Marcelinho, muita gente tinha vergonha de falar que era da Paraíba. E não é força de expressão. Outros craques paraibanos, a exemplo de Mazinho e Júnior ‘Capacete’, que fizeram sucessos anos antes na seleção brasileira e em clubes de massas como Palmeiras, Vasco e Flamengo, nunca chegaram a ter, por opção, a identificação que Marcelinho tem com a Paraíba. A partir dali, o Marcelinho do São Paulo deixou de ser apenas Marcelinho e ganhou a alcunha do estado em seu nome.
Pelo tricolor paulista foram dois títulos paulistas conquistados sobre os arquirrivais Corinthians (1998) e Santos (2000), com direito a gol na decisão contra o Peixe. O vasto currículo no mundo da bola reservou outros momentos inesquecíveis para o menino que saiu do Zepa, como é mais conhecido o José Pinheiro, bairro da zona leste de Campina Grande.
Antes de seguir para Europa, onde viraria ídolo no Hertha Berlim da Alemanha e escolhido o melhor jogador do país em 2005, o agora já Marcelinho Paraíba conduziu o Grêmio de Tite, atual técnico da seleção brasileira, na conquista da Copa do Brasil de 2001. Na final contra o Corinthians, no Morumbi, um gol e uma assistência na vitória por 3 a 1 após um empate em 2 a 2 em Porto Alegre.
Rei na Alemanha
O brilho por São Paulo e Grêmio levou o ilustre paraibano ao futebol europeu. Foram cinco anos mágicos no Hertha Berlim, da capital alemã. Gols, boas campanhas na Bundesliga e disputando as principais competições europeias. Em 2005, foi escolhido o melhor jogador do país pelos 232 atletas profissionais que participaram da escolha. Não à toa, é considerado um dos maiores ídolos do clube e recebeu uma grande homenagem em 2017, com 25 mil torcedores o aplaudindo em partida de estrelas no mítico Estádio Olímpico.
Seleção Brasileira
Na transição entre o Grêmio e a Alemanha, Marcelinho foi chamado por Luiz Felipe Scolari em um momento delicadíssimo da seleção brasileira visando a classificação para Copa do Mundo de 2002. O escrete brasileiro era questionado nas Eliminatórias após a eliminação na Copa América de 2001 para inexpressiva seleção de Honduras. A classificação para o Mundial veio nas rodadas finais, com muito sofrimento e a contribuição vital de Paraíba.
Na difícil partida contra a seleção do Paraguai de Chilavert e Arce, vice-líder das Eliminatórias, o jogador do Grêmio abriu caminho para apertada vitória por 2 a 0 no Olímpico, a sua “Casa”, em Porto Alegre. Apesar de começar a viver o seu melhor momento na carreira e da contribuição para levar o Brasil ao Japão, Marcelinho não foi chamado por Felipão para Copa. Em recente entrevista ao SporTV, o paraibano revelou uma mágoa com o treinador por não ter sido levado para campanha do Penta.
A volta à Paraíba: chapéu no “time do coração” e idolatria no Treze
Depois de voltar da Alemanha e rodar por vários clubes do Brasil, incluindo certamente a mais marcante pelo Sport Recife em 2011, com a conquista do acesso à Série A, Marcelinho voltou à Paraíba em 2017. Aos 41 anos, o plano de muito tempo era de encerrar a carreira no Campinense, time de coração e onde tudo começou em 1993. Mas o destino foi outro e com requintes de crueldade para o lado vermelho de Campina Grande.
Depois de ser anunciado precipitadamente pelo Campinense, que não havia conseguido a liberação do seu passe junto ao Internacional de Lages-SC e ao empresário, a negociação com a Raposa melou. A informação, que contrariou a cúpula rubro-negra em outubro de 2016, foi dada em primeira mão pelo autor do Blog em sua coluna no MaisPB. Em novembro do mesmo ano, o autor do Blog informava o acerto do jogador com o arquirrival Treze.
No Galo, Marcelinho foi fundamental para sobrevivência do clube. Em tempos de vaca magra do alvinegro do bairro do São José, o camisa 10 liderou a equipe em campo e fora dele na campanha do vice-campeonato paraibano de 2017. A classificação sobre o Campinense, com direito a gol do “vovô Marcelinho” em uma das duas partidas das semifinais, garantiu o Treze na Série D do ano seguinte.
Com gols, assistências e lideranças, Marcelinho conduziu o Galo, como fizera com Grêmio em 2001 na Copa do Brasil, ao acesso à Série C de 2019. No ano passado, Paraíba ainda foi importantíssimo, novamente com gols e assistências, para evitar a queda da equipe para Série D.
Chuteiras penduradas
A carreira de Marcelinho nos gramados será encerrada hoje com a camisa da Perilima. A modesta equipe de Campina Grande recebe o CSP, no Amigão, pela oitava rodada do Campeonato Paraibano. A partida não deve atrair tantos telespectadores como a carreira de Marcelinho merecesse. Ele e toda Paraíba só dará conta do quão foi grande no futebol depois.